Eugénio de Andrade
AQUELA NUVEM E EU
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A SÍLABA
Não é de palavras apenas que a poesia se faz. Não é qualquer palavra que faz um poema. Uma palavra combina-se com outra, num verso, não apenas na combinação dos seus sentidos mas também pela atracão das suas sílabas. É esta experiência que procuramos fazer viver as crianças com quem trabalhamos, a partir das idades mais precoces, integrados num processo onde a compreensão do texto, embora contando, conta menos que a experiência sonora da palavra que arrasta o sentido consigo – “em verso não preciso de compreender mas em prosa sim”, dizia Sophia de Mello Breyner, numa carta a Jorge de Sena.
Num primeiro momento, procuramos, então, a fruição da leitura, ouvindo o poema na voz do seu autor (Eugénio de Andrade). E experimentamos ler com ele, e a afastarmo-nos dele também, noutros modos de ler, noutras formas de fazer ouvir as palavras. E tudo isto sem pressões. Não queremos dar cabo do momento: lê quem quer, e não há nunca lugar a reparos que desmoralizem.
Num segundo momento, entramos no poema com a nossa escrita.
Há superfície é de sílabas que o poema fala: “Só eu sei a falta que me faz”, diz Eugénio de Andrade, na passagem para o que poderíamos chamar de segunda parte do poema. É nesta parte do poema que vamos investir, seguindo um processo idêntico ao utilizado na recriação do excerto de “Quasi”, de Mário de Sá-Carneiro: Eugénio de Andrade procurava a sílaba que o defendia do frio de janeiro e da estiagem do verão. E nós que vamos procurar? De que sílaba precisamos? e para quê?